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O Caso do Romualdo, de Machado de Assis
UM DIA, de manhã, D. Maria Soares, que estava em casa, descansando de um baile para
ir a outro, foi procurada por D. Carlota, companheira antiga de colégio, e sócia agora da
vida elegante. Considerou isso um benefício do acaso, ou antes um favor do céu, com o
fim único de lhe matar as horas aborrecidas. E merecia esse favor, pois de madrugada,
ao voltar do baile, não deixou de cumprir as rezas do costume, e, logo à noite, antes de ir
para o outro, não deixará de persignar-se.
D. Carlota entrou. Ao pé uma da outra pareciam irmãs; a dona da casa era, talvez, um
pouco mais alta, e tinha os olhos de outra cor; eram castanhos, os de D. Carlota pretos.
Outra diferença: esta era casada, D. Maria Soares, viúva: — ambas possuíam alguma
cousa, e não chegavam a trinta anos; parece que a viúva contava apenas vinte e nove,
posto confessasse vinte e sete, e a casada andava nos vinte e oito. Agora, como é que
uma viúva de tal idade, bonita e abastada, não contraía segundas núpcias é o que toda a
gente ignorou sempre. Não se pode supor que fosse fidelidade ao morto, pois é sabido
que ela não o amava muito nem pouco; foi um casamento de arranjo. Talvez não se pode
crer que lhe faltassem pretendentes; tinha-os às dúzias.
— Você chegou muito a propósito, disse a viúva a Carlota; vamos falar de ontem... Mas
que é isso? que cara é essa?
Na verdade, a cara de Carlota trazia impressa uma tempestade interior; os olhos
faiscavam, e as narinas moviam-se deixando passar uma respiração violenta e colérica. A
viúva insistiu na pergunta, mas a outra não lhe disse nada; atirou-se a um sofá, e só no
fim de uns dez segundos, proferiu algumas palavras que explicaram a agitação. Tratavase de um arrufo, não briga com o marido, por causa de um homem. Ciúmes? Não, não,
nada de ciúmes. Era um homem, com que ela antipatizava profundamente, e que ele
queria fazer amigo da casa. Nada menos, nada mais, e antes assim. Mas por que é que
ele queria relacioná-lo com a mulher?
Custa dizê-lo: ambição política. Vieira quer ser deputado por um distrito do Ceará, e
Romualdo tem ali influência, e trata de fazer vingar a candidatura do amigo. Então este,
não só quer metê-lo em casa — e já ali o levou duas vezes — como tem o plano de lhe
dar um jantar solene, em despedida, porque o Romualdo embarca para o Norte dentro de
uma semana. Aí está
todo o motivo do dissentimento.
— Mas, Carlota, dizia ele à mulher, repara que é a minha carreira. Romualdo é trunfo
no distrito. E depois não sei que embirração é essa, não entendo...
Carlota não dizia nada; torcia a ponta de uma franja.
— O que é que achas nele?
— Acho-o antipático, aborrecido...
— Nunca trocaram mais de oito palavras, se tanto, e já o achas aborrecido!
— Tanto pior. Se ele é aborrecido calado, imagina o que será falando. E depois...
— Bem, mas não podes sacrificar-me alguma cousa? Que diabo é uma ou duas horas
de constrangimento, em benefício meu? E mesmo teu, porque, eu na Câmara, tu ficas
sendo mulher de deputado, e pode ser... quem sabe? Pode ser até que de ministro, um
dia. Desta massa é que eles se fazem.
Vieira gastou uns dez minutos em sacudir diante da mulher as pompas de um grande
cargo, uma pasta, ordenanças, fardão ministerial, correios do paço, e as audiências, e os
pretendentes, e as cerimônias... Carlota não se abalava. Afinal, exasperada, fez ao
marido uma revelação.
— Ouviu bem? O tal seu amigo persegue-me com os olhos de mosca-morta, e das oito
palavras que me disse, três, pelo menos, foram atrevidas.
Vieira ficou alguns instantes sem dizer nada; depois começou a mexer com a corrente
do relógio, afinal acendeu um charuto. Estes três gestos correspondiam a três momentos
do espírito. O primeiro foi de pasmo e raiva. Vieira amava a mulher, e, por outro lado, cria
que os intuitos do Romualdo eram puramente políticos. A descoberta de que a proteção
da candidatura tinha uma paga, e paga adiantada, foi para ele um assombro. Veio depois
o segundo momento, que foi o da ambição, a cadeira na Câmara, a reputação
parlamentar, a influência, um ministério... Tudo isso atenuou a primeira impressão. Então
ele perguntou a si mesmo, se, estando certo da mulher, não era já uma grande habilidade
política explorar o favor do amigo, e deixá-lo ir-se de cabeça baixa. Em rigor, a pretensão
do Romualdo não seria única; Carlota teria outros namorados in petto. Não se havia de
brigar com o mundo inteiro. Aqui entrou o terceiro momento, o da resolução. Vieira
determinou-se a aproveitar o favor político do outro, e assim o declarou à mulher, mas
começou por dissuadi-la.
— Pode ser que você se engane. As moças bonitas estão expostas a serem olhadas
muita vez por admiração, e se cuidarem que já isso é amor, então nem podem mais
aparecer.
Carlota sorriu com desdém.
— As palavras? disse o marido. Não podiam ser palavras de cumprimento? Podiam,
decerto...
E, depois de um instante, como lhe visse persistir o ar desdenhoso:
— Juro que se tivesse a certeza do que me dizes, castigava-o... Mas, por outro lado, é
justamente a vingança melhor; faço-o trabalhar, e... justamente! Querem saber uma
cousa. A vida é uma combinação de interesses... O que eu quero é fazer-te ministra de
Estado, e...
Carlota deixou-o falar, à toa. Como ele insistisse, ela prorrompeu e disse-lhe cousas
duras. Estava sinceramente irritada. Gostava muito do marido, não era loureira, e nada
podia agravá-la mais do que o acordo que o marido procurava entre a conveniência
política e os sentimentos dela. Ele, afinal, saiu zangado; ela vestiu-se e foi para a casa da
amiga.
Hão de perguntar-me como se explica que, tendo mediado algumas horas, entre a
briga e a chegada à casa da amiga, Carlota ainda estava no grau agudo da exasperação.
Respondo que em alguma cousa há de uma moça ser faceira, e pode ser que a nossa
Carlota gostasse de ostentar os seus sentimentos de amor ao marido e de honra
conjugal, como outras mostram de preferência os olhos e o método de mexer com eles.
Digo que pode ser; não afianço nada.
Ouvida a história, D. Maria Soares concordou em parte com a amiga, em parte com o
marido, posto que, realmente, só concordasse consigo mesma, e acreditasse piamente
que o maior desastre que podia suceder a uma criatura humana, depois de uma noite de
baile, era entrar-lhe em casa uma questão daquelas.
Carlota tratou de provar que tinha razão em tudo, e não parcialmente; e a viúva diante
da ameaça de maior desastre, foi admitindo que sim, que afinal quem tinha toda a razão
era ela, mas que o melhor de tudo era deixar andar o marido.
— É o melhor, Carlota; você não está certa de si? Pois então deixe-o andar... Vamos
nós à Rua do Ouvidor? ou vamos mais perto, um passeiozinho...
Era um meio de acabar com o assunto; Carlota aceitou, D. Maria foi vestir-se, e daí a
pouco saíram ambas. Vieram à Rua do Ouvidor, onde não foi difícil esquecer o assunto, e
tudo acabou ou ficou adiado. Contribuiu para isso o baile da véspera; a viúva alcançou
finalmente que falassem das impressões trazidas, falaram por muito tempo, esquecidas
do resto, e para não voltar logo para a casa, foram comprar alguma cousa a uma loja.
Que cousa? Nunca se soube claramente o que foi; há razões para crer que foi um metro
de fita, outros dizem que dous, alguns opinam por uma dúzia de lenços. O único ponto
liquidado é que estiveram na loja até quatro horas.
Ao voltar para casa, perto da Rua Gonçalves Dias, Carlota disse precipitadamente à
amiga:
— Lá está ele!
— Quem?
— O Romualdo.
— Onde está?
— É aquele de barbas grandes, que está coçando o queixo com a bengala, explicou a
moça olhando para outra parte.
D. Maria Soares relanceou os olhos pelo grupo, disfarçadamente, e viu o Romualdo.
Não ocultou a impressão; confessou que era, na verdade, um sujeito antipático; podia ser
trunfo em política; em amor, devia ser carta branca. Mas, além de antipático, tinha um
certo ar de matuto, que não convidava a amá-lo. Elas foram andando, e não escaparam
ao Romualdo, que vira Carlota e veio cumprimentá-la, afetuoso, posto que também
acanhado; perguntou-lhe pelo marido, e se ia naquela noite, ao baile, disse também que o
dia estava fresco, que tinha visto umas senhoras conhecidas de Carlota, e que a rua
parecia mais animada naquele dia do que na véspera. Carlota foi respondendo com
palavras frouxas, entre dentes.
— Exagerei? perguntou ela à viúva no bond.
— Qual exageraste! O sujeito é insuportável, acudiu a viúva; mas, Carlota, não te acho
razão na zanga. Pareces criança! Um sujeito assim não faz zangar ninguém. A gente
ouve o que ele diz, não lhe responde nada, ou fala do sol e da lua, e está acabado; é até
um divertimento. Já tive muitos do mesmo gênero...
— Sim, mas não tens um marido que...
— Não tenho, mas tive; o Alberto era do mesmo gênero; eu é que não brigava, nem lhe
revelava nada; ria-me. Faze a mesma cousa; vai rindo... Realmente, o sujeito tem um
olhar espantado, e quando sorri fica mesmo com uma cara de poucos amigos; parece que
sério é menos carrancudo.
— E é...
— Bem vi que era. Ora zangar-se a gente por tão pouca cousa! Demais, ele não vai
embora esta semana? Que te custa suportá-lo?
D. Maria Soares tinha aplacado inteiramente a amiga; enfim, o tempo e a rua
perfizeram a melhor parte da obra. Para o fim da viagem, riam ambas, não só da figura do
Romualdo, mas também das palavras que ele dissera a Carlota, as tais palavras
atrevidas, que não ponho aqui por não haver notícia exata delas; estas, porém, confiou-as
à viúva, não as tendo dito ao marido. A viúva opinou que elas eram menos atrevidas que
burlescas. E ditas por ele deviam ser ainda piores. Era mordaz esta viúva, e amiga de rir e
brincar como se tivesse vinte anos.
A verdade é que Carlota voltou para casa tranqüila, e disposta ao banquete. Vieira, que
esperava a continuação da luta, não pôde encobrir o contentamento de a ver mudada.
Confessou que ela tinha razão em mortificar-se, e que ele, se não estivessem as cousas
em andamento, abriria mão da candidatura; já o não podia fazer sem escândalo.
Chegou o dia do jantar, que foi esplêndido, assistindo a ele vários personagens políticos
e outros. De senhoras, apenas duas, Carlota e D. Maria Soares. Um dos brindes de
Romualdo foi feito a ela — um longo discurso, arrastado, cantado, assoprado, cheio de
anjos, de um ou dous sacrários, de caras esposas, acabando tudo per um cumprimento
ao nosso venturoso amigo. Vieira interiormente mandou-o ao diabo; mas, levantou o copo
e agradeceu sorrindo.
Dias depois, seguia Romualdo para o Norte. A noite da véspera foi passada em casa
do Vieira, que se desfez em demonstrações de aparente consideração. De manhã,
levantou-se este cedo para ir a bordo, acompanhá-lo; recebeu muitos cumprimentos para
a mulher, à despedida, e prometeu que daí a pouco iria ter com ele. O aperto de mão foi
significativo;
um tremia de esperanças, outro de saudades, ambos pareciam pôr naquele arranco final
todo o coração, e punham tão-somente o interesse, — ou de amor ou de política, — mas
o velho interesse, tão amigo da gente e tão caluniado.
Pouco tempo depois, seguiu o Vieira para o Norte, a cuidar da eleição. As despedidas
foram naturalmente chorosas, e por pouco, esteve Carlota disposta a seguir também com
ele; mas a viagem não duraria muito tempo, e depois, ele teria de percorrer o distrito,
cuidar de cousas que tornavam difícil a condução da família.
Ficando só, Carlota cuidou de matar o tempo, para torná-lo mais curto. Não foi a teatros
nem bailes; mas visitas e passeios eram com ela. D. Maria Soares continuava a ser a
melhor das companheiras, rindo muito, reparando em tudo, e mordendo sem piedade.
Naturalmente, o Romualdo foi esquecido; Carlota chegou mesmo a arrepender-se de ter
ido confiar à amiga uma cousa, que agora lhe parecia mínima. Demais, a idéia de ver o
marido deputado, e provavelmente ministro, começava a dominá-la, e a quem o deveria,
senão ao Romualdo? Tanto bastava para não torná-lo odioso nem ridículo. A segunda
carta do marido confirmou-a nesse sentimento de indulgência; dizia que a candidatura
tinha esbarrado num grande obstáculo, que o Romualdo destruíra, graças a um imenso
esforço, em que até perdeu um amigo de vinte anos.
Tudo caminhou assim, enquanto Carlota, aqui na corte, ia matando o tempo, segundo
ficou dito. Já disse também que D. Maria Soares ajudava-a nessa empresa. Resta dizer,
que não sempre, mas às vezes, tinham ambas um parceiro, que era o Dr. Andrade,
companheiro de escritório do Vieira, e encarregado de todos os seus negócios, durante a
ausência. Este era um
advogado recente, vinte e cinco anos, não deselegante, nem feio. Tinha talento, era ativo,
instruído, e não pouco sagaz, em negócios do foro; para o resto das cousas, conservava
a ingenuidade primitiva.
Corria que ele gostava de Carlota, e mal se compreende um tal boato, pois a ninguém
confiou nada, nem mesmo a ela, por palavras ou obras. Pouco ia lá; e quando ia procedia
de modo que não desse azo a nenhuma suspeita. É certo, porém, que ele gostava dela, e
muito, e se nunca lho declarou, menos o faria agora. Evitava até ir lá; mas Carlota
convidou-o algumas vezes a jantar, com outras pessoas; D. Maria Soares, que o viu ali,
também o convidou, e foi assim que ele achou-se mais vezes do que pretendia em
contacto com a senhora do outro.
D. Maria Soares desconfiou previamente do amor do Andrade. Era um dos seus
princípios desconfiar dos corações de vinte e cinco a trinta e quatro anos. Antes de ver
nada, suspeitou que o Andrade amava a amiga, e só — tratou de ver se a amiga lhe
correspondia. Não viu nada; mas concluiu alguma cousa. Então considerou que esse
coração abandonado, tiritando de frio na rua, podia ela recebê-lo, agasalhá-lo, dar-lhe o
principal lugar, numa palavra, casar com ele. Pensou nisto um dia; no dia seguinte,
acordou apaixonada. Já? Já, e explica-se. D. Maria Soares gostava da vida brilhante,
ruidosa, dispendiosa, e o Andrade, além das outras qualidades, não viera a este mundo
sem uma avó, nem esta avó se deixara viver até aos setenta e
quatro anos, na fazenda sem uns oitocentos contos. Constava estar na dependura; e foi a
própria Carlota que lho disse a ela.
— Parece que até já está pateta.
— Oitocentos contos? repetiu D. Maria Soares.
— Oitocentos; é uma boa fortuna.
D. Maria Soares olhou para um dos quadros que Carlota tinha na saleta: uma paisagem
da Suíça. Bela terra é a Suíça! disse ela. Carlota admitiu que o fosse, mas confessou que
preferia viver em Paris, na grande cidade de Paris... D. Maria Soares suspirou, e olhou
para o espelho. O espelho respondeu-lhe sem cumprimento: “Pode tentar a empresa,
ainda está muito
bonita”.
Assim se explica o primeiro convite de D. Maria Soares ao Andrade, para ir jantar à
casa dela, com a amiga, e outras pessoas. Andrade foi, jantou, conversou, tocou piano —
pois também sabia tocar piano — e recebeu da viúva os mais ardentes encômios.
Realmente, nunca tinha visto tocar assim; não conhecia amador que pudesse competir
com ele. Andrade gostou de ouvir isto, principalmente porque era dito ao pé de Carlota.
Para provar que a viúva não elogiava a um ingrato, voltou ao piano, e deu sonatas,
barcarolas, rêveries, Mozart, Schubert, nomes novos e antigos. D. Maria Soares estava
encantada.
Carlota percebeu que ela começava a cortejá-lo, e sentiu não ter intimidade com ele,
que lhe permitisse dizer-lho por brinco; era um modo de os casar mais depressa, e
Carlota estimaria ver a amiga em segundas núpcias, com oitocentos contos à porta. Em
compensação disse-o à amiga, que pela regra eterna das cousas negou-o a pés juntos.
— Pode negar, mas eu bem vejo que você anda ferida, insistiu Carlota.
— Então é ferida que não dói, porque eu não sinto nada, replicou a viúva.
Em casa, porém, advertiu que Carlota lhe falara com tal ingenuidade e interesse, que
era melhor dizer tudo, e utilizá-la na conquista do advogado. Na primeira ocasião, negou
sorrindo e vexada; depois, abriu o coração, previamente aparelhado para recebê-lo, cheio
de amor por todos os cantos. Carlota viu tudo, andou por ele, e saiu convencida de que,
apesar da diferença
de idade, nem ele podia ter melhor esposa, nem ela melhor marido. A questão era uni-los,
e Carlota dispôs-se à obra.
Eram então passados dous meses depois da saída do Vieira, e chegou uma carta dele
com a notícia de estar de cama. A letra pareceu tão trêmula, e a carta era tão curta, que
lançou o espírito de Carlota na maior perturbação. No primeiro instante, a sua idéia foi
embarcar e ir ter com o marido; mas o advogado e a viúva procuravam aquietá-la,
dizendo-lhe que não era caso
disso, e que provavelmente já estaria bom; em todo caso, era melhor esperar outra carta.
Veio outra carta, mas do Romualdo, dizendo que o estado do Vieira era grave, não
desesperado; os médicos aconselhavam que tornasse para o Rio de Janeiro; eles viriam
na primeira ocasião.
Carlota ficou desesperada. Começou por não crer na carta. “Meu marido morreu,
soluçava ela; estão me enganando.” Entretanto, veio terceira carta do Romualdo, mais
esperançada. O doente já podia embarcar, e viria no vapor que dali sairia dous dias
depois; ele o acompanharia com todas as cautelas, e a mulher podia não ter cuidado
nenhum. A carta era simples,
verdadeira, dedicada e pôs um calmante no espírito da moça.
Com efeito, Romualdo embarcou, acompanhando o doente, que passou bem o primeiro
dia de mar. No segundo piorou, e o estado agravou-se de modo que, ao chegar à Bahia,
pensou o Romualdo que era melhor desembarcar; mas o Vieira recusou formalmente uma
e muitas vezes, dizendo que se tivesse de morrer, preferia vir morrer ao pé da família.
Não houve remédio senão ceder, e por mal dele, expirou vinte e quatro horas depois.
Poucas horas antes de morrer, o advogado sentiu que era chegado o termo fatal, e fez
algumas recomendações ao Romualdo, relativamente a negócios de família e do foro;
umas deviam ser transmitidas à mulher; outras ao Andrade, companheiro de escritório,
outras a parentes. Só uma importa ao nosso caso.
— Diga à minha mulher que a última prova de amor que lhe peço é que não se case...
— Sim... sim...
— Mas, se ela, a todo o transe entender que se deve casar, peça-lhe que a escolha do
marido recaia no Andrade, meu amigo e companheiro, e...
Romualdo não entendeu essa preocupação da última hora, nem provavelmente o leitor,
nem eu — e o melhor, em tal caso, é contar e ouvir a cousa sem pedir explicação. Foi o
que ele fez; ouviu, disse que sim, e poucas horas depois, expirava o Vieira. No dia
seguinte, entrava o vapor no porto, trazendo a Carlota um cadáver, em vez do marido que
daqui partira.
Imaginem a dor da pobre moça, que aliás receava isso mesmo, desde a última carta de
Romualdo. Chorara em todo esse tempo, e rezou muito, e prometeu missas, se o pobre
Vieira lhe chegasse vivo e são: mas nem rezas, nem promessas, nem lágrimas.
Romualdo veio à terra, e correu à casa de D. Maria Soares, pedindo a sua intervenção
para preparar a recente viúva a receber a fatal notícia; e ambos passaram à casa de
Carlota, que adivinhou tudo, apenas os viu. O golpe foi o que devia ser, não é preciso
narrá-lo. Nem o golpe, nem o enterro, nem os primeiros dias. Saiba-se que Carlota
retirou-se da cidade por algumas semanas, e só voltou à antiga casa, quando a dor lhe
consentiu vê-la, mas não pôde vê-la sem lágrimas. Ainda assim não quis outra; preferia
padecer, mas queria as mesmas paredes e lugares que tinham visto o marido e a sua
felicidade.
Passados três meses, Romualdo tratou de desempenhar-se da incumbência que o
Vieira lhe dera, à última hora, e nada mais difícil para ele, não porque amasse a viúva do
amigo — realmente, tinha sido uma cousa passageira —, mas pela natureza mesmo da
incumbência. Entretanto, era forçoso fazê-lo. Escreveu-lhe uma carta, dizendo que tinha
de dizer-lhe, em particular, cousas graves que ouvira ao marido, poucas horas antes de
morrer. Carlota respondeu-lhe com este bilhete:
Pode vir quanto antes, e se quiser hoje mesmo, ou amanhã, depois do meio-dia; mas
prefiro que seja hoje. Desejo saber o que é, e ainda uma vez agradecer-lhe a dedicação
que mostrou ao meu infeliz marido.
Romualdo foi nesse mesmo dia, entre três e quatro horas. Achou ali D. Maria Soares,
que não se demorou muito, e os deixou sós. Eram duas viúvas, e ambas de preto, e
Romualdo pôde compará-las, e achou que a diferença era imensa; D. Maria Soares dava
a sensação de uma pessoa que escolhera a viuvez por ofício e comodidade. Carlota
estava ainda acabrunhada, pálida e séria. Diferença de data ou de temperamento?
Romualdo não pôde averiguá-lo, não chegou sequer a formular a questão. Medíocre de
espírito, este homem tinha uma dose grande de sensibilidade, e a figura de Carlota
impressionou-o de modo, que não lhe deu lugar a mais do que à comparação das
pessoas. Houve mesmo da parte de D. Maria Soares duas ou três frases que pareceram
ao Romualdo um tanto esquisitas. Uma delas foi esta:
— Veja se persuade a nossa amiga a conformar-se com a sorte; lágrimas não
ressuscitam ninguém.
Carlota sorriu sem vontade, para responder alguma cousa, e Romualdo rufou com os
dedos sobre o joelho, olhando para o chão. D. Maria Soares levantou-se afinal, e saiu.
Carlota, que a acompanhou até à porta, voltou ansiosa ao Romualdo, e pediu que lhe
dissesse tudo, tudo, as palavras dele, e a doença, e como foi que começou, e os cuidados
que lhe deu, e que ela
soube aqui e lhe agradecia muito. Tinha visto uma carta de pessoa da província, dizendo
que a dedicação dele não podia ser maior. Carlota falava às pressas, cheia de comoção,
sem ordem nas idéias.
— Não falemos do que fiz, disse o Romualdo; cumpri um dever natural.
— Bem, mas eu agradeço-lhe por ele e por mim, replicou ela estendendo-lhe a mão.
Romualdo apertou-lhe a mão, que estava trêmula, e nunca lhe pareceu tão deliciosa.
Ao mesmo tempo, olhou para ela e viu que a cor pálida ia-lhe bem, e com o vestido preto,
tinha um tom ascético e particularmente interessante. Os olhos cansados de chorar não
traziam o mesmo fulgor de outro tempo, mas eram muito melhores assim, como uma
espécie de meia-luz de alcova, abafada pelas cortinas e venezianas fechadas.
Nisto pensou na comissão que o levava ali, e estremeceu. Começava a palpitar, outra
vez, por ela, e agora que a achava livre, ia levantar duas barreiras entre ambos: — que se
não casasse, e que, a fazê-lo, casasse com outro, uma pessoa determinada. Era exigir
demais. Romualdo pensou em não dizer nada, ou dizer outra cousa qualquer. Que
cousa? Qualquer cousa. Podia atribuir ao marido uma recomendação de ordem geral, que
se lembrasse dele, que lhe sufragasse a alma por certa maneira. Tudo era crível, e não
prenderia assim o futuro com uma palavra. Carlota, sentada defronte, esperava que ele
falasse; chegou a repetir o pedido. Romualdo sentiu um repelão da consciência. No
momento de formular a recomendação falsa, recuou, teve vergonha, e dispôs-se à
verdade. Ninguém sabia o que se passara entre ele e o finado, senão a consciência dele,
mas a consciência bastava, e ele obedeceu. Paciência! era esquecer o passado, e adeus.
— Seu marido — começou —, no mesmo dia em que morreu, disse-me que tinha um
grande favor que pedir-me, e fez-me prometer que cumpriria tudo. Respondi-lhe que sim.
Então, disse-me ele que era um grande benefício que a senhora lhe fazia, se se
conservasse viúva, e que lhe pedisse isto, como um desejo da hora da morte. Entretanto,
dado que não pudesse fazê-lo...
Carlota interrompeu-o com o gesto: não queria ouvir nada, era penoso. Mas o
Romualdo insistiu, tinha de cumprir...
Foram interrompidos por um criado; o Dr. Andrade acabava de chegar, trazendo à
viúva uma comunicação urgente.
Andrade entrou, e pediu a Carlota para lhe falar em particular.
— Não é preciso, retorquiu a moça, este senhor é nosso amigo, pode ouvir tudo.
Andrade obedeceu e disse ao que vinha; este incidente é sem valor para o nosso caso.
Depois, conversaram os três durante alguns minutos. Romualdo olhava para o Andrade
com inveja, e tornou a perguntar a si mesmo se lhe convinha dizer alguma cousa. A idéia
de dizer outra cousa qualquer começou a turvar-lhe novamente o espírito. Ao ver o jovem
advogado tão gracioso, tão atraente, Romualdo concluiu — e não concluiu mal — que o
pedido do morto era um incitamento; e se Carlota nunca pensara em casar, era ocasião
de fazê-lo. O pedido chegou a parecer-lhe tão absurdo, que a idéia de alguma
desconfiança do marido veio naturalmente, e atribuiu-lhe assim a intenção de punir
moralmente a mulher: — conclusão, por outro lado, não menos absurda, à vista do amor
que ele testemunhara no casal.
Carlota, na conversação, manifestou o desejo de retirar-se para a fazenda de uma tia,
logo que acabasse o inventário; mas, se demorasse muito tempo iria em breve.
— Farei o que puder para ir depressa, disse o Andrade.
Daí a pouco saiu este, e Carlota, que o acompanhara até a porta, voltou ao Romualdo,
para dizer-lhe:
— Não quero saber o que foi que meu marido lhe confiou. Ele pede-me o que por mim
mesmo faria: — ficarei viúva..
Romualdo podia não ir adiante, e desejou isso mesmo. Estava certo da sinceridade da
viúva, e da resolução anunciada; mas o diabo do Andrade com os seus modos finos e
olhos cálidos fazia-lhe travessuras no cérebro. Entretanto, a solenidade da promessa
tornou a aparecer-lhe como um pacto que se havia de cumprir, custasse o que custasse.
Ocorreu-lhe um meio-termo: obedecer à viúva, e calar-se, e, um dia, se ela deveras se
mostrasse disposta a contrair segundas núpcias, completar-lhe a declaração.Mas não
tardou em ver que isto era uma infidelidade disfarçada; em primeiro lugar, ele poderia
morrer antes, ou estar fora, em serviço ou doente; em segundo lugar, poderia ser que lhe
falasse, quando ela estivesse apaixonada por outro. Resolveu dizer tudo.
— Como ia dizendo, continuava ele, seu marido...
— Não diga mais nada, interrompeu Carlota; para quê?
— Será inútil, mas devo cumprir o que prometi ao meu pobre amigo. A senhora pode
dispensá-lo, eu é que não. Pede-lhe que se conserve viúva; mas que, no caso de não lhe
ser possível, pedir-lhe-ia bem que a sua escolha recaísse no... Dr. Andrade...
Carlota não pôde ocultar o espanto, e não teve só um, mas dous, um atrás do outro.
Quando Romualdo concluía o pedido, antes de dizer o nome do Andrade, Carlota
imaginou que ia citar o dele mesmo; e, rápido, tanto lhe pareceu um desejo do marido
como uma astúcia do portador, que a cortejara antes. Esta segunda suspeita entornou-lhe
na alma um grande desgosto e desprezo. Tudo isso passou como um relâmpago, e
quando chegou ao fim, ao nome do Andrade, mudou de espanto, e não foi menor. Esteve
calada alguns segundos, olhando à toa; depois, repetiu o que já dissera.
— Não pretendo casar.
— Tanto melhor, disse ele, para os desejos últimos de seu marido. Não lhe nego que o
pedido me pareceu exceder do direito de um moribundo; mas não me cabe discuti-lo: é
questão entre a senhora e a sua consciência.
Romualdo levantou-se.
— Já? disse ela.
— Já.
— Jante comigo.
— Peço-lhe que não; virei outro dia, disse ele estendendo-lhe a mão.
Carlota estendeu-lhe a mão. Pode ser que se ela estivesse com o espírito quieto,
percebesse nos modos do Romualdo alguma cousa que não era a audácia de outrora. Na
verdade, ele estava agora acanhado, comovido, e a mão tremia-lhe um tanto. Carlota
apertou-lha cheia de agradecimento; ele saiu.
Ficando só, Carlota refletiu em tudo o que se passara. A lembrança do marido pareceulhe também extraordinária; e, não tendo ela jamais pensado no Andrade, não pôde furtarse a pensar nele e na simples indicação do moribundo. Tanto pensou em tudo isso, que
lhe ocorreu finalmente a posição do Romualdo. Esse homem tinha-a cortejado, parecia
querê-la, recebeu do marido, prestes a expirar, a confidência última, o pedido da viuvez e
a designação de um sucessor, que não era ele, mas outro; e, não obstante, cumpriu tudo
fielmente. O procedimento pareceu-lhe heróico. E daí pode ser que já não a amasse: e
foi, talvez, um capricho de momento; estava acabado; nada mais natural.
No dia seguinte, ocorreu a Carlota a idéia de que Romualdo, sabendo da amizade do
marido com o Andrade, podia ir comunicar a este o pedido do moribundo, se já o não
tinha feito. Mais que depressa, lembrou-se de mandar chamá-lo, e pedir-lhe que viesse
vê-la; chegou mesmo a escrever-lhe um bilhete, mas mudou de idéia, e, em vez de pedirlho de viva voz, determinou fazê-lo por escrito. Eis o que escreveu:
Estou certa de que as últimas palavras de meu marido foram apenas repetidas a mim
e a ninguém mais; entretanto, como há outra pessoa, que poderia ter interesse em
saber...
Chegando a este ponto da carta, releu-a, e rasgou-a. Parecia-lhe que a frase tinha um
tom misterioso, inconveniente na situação. Começou outra, e não lhe agradou também; ia
escrever terceira, quando vieram anunciar-lhe a presença do Romualdo; correu à sala.
— Escrevia-lhe agora mesmo, disse ela logo depois.
— Para quê?
— Referiu aquelas palavras de meu marido a alguém?
— A ninguém. Não podia fazê-lo.
— Sei que não o faria; entretanto, nós, as mulheres, somos naturalmente medrosas, e
o receio de que alguém mais, quem quer que seja saiba do que se passou, peço-lhe que
por nenhuma cousa refira a outra pessoa...
— Certamente que não.
— Era isto o que lhe dizia a carta.
Romualdo vinha despedir-se; seguia daí três dias para o Norte. Pedia-lhe desculpa de
não ter aceitado o convite de jantar, mas na volta...
— Volta? interrompeu ela.
— Conto voltar.
— Quando?
— Daqui a dous meses ou dous anos.
— Cortemos ao meio; seja daqui a quatro meses.
— Depende.
— Mas, então, sem jantar comigo uma vez? Hoje, por exemplo...
— Hoje estou comprometido.
— E amanhã?
— Amanhã vou a Juiz de Fora.
Carlota fez um gesto de resignação; depois perguntou-lhe se na volta do Norte.
— Na volta.
— Daqui a quatro meses?
— Não posso afirmar nada.
Romualdo saiu; Carlota ficou pensativa algum tempo.
“Singular homem! pensou ela. Achei-lhe a mão fria e, entretanto...”
Depressa passou a Carlota a impressão que lhe deixara o Romualdo. Este seguiu, e
ela retirou-se à fazenda da tia, enquanto o Dr. Andrade continuou o inventário. Quatro
meses depois, voltou Carlota a esta corte, mais curada das saudades, e em todo caso
cheia de resignação. A amiga encarregou-se de acabar a cura, e não lhe foi difícil.
Carlota não esquecera o marido; ele estava presente ao coração, mas o coração
também cansa de chorar. Andrade que a freqüentava, não pensara em substituir o finado
marido; ao contrário, parece que principalmente gostava da outra. Pode ser também que
fosse mais cortesão com ela, por ela ser menos recente viúva. O que toda a gente cria é
que dali, qualquer que fosse a escolhida, tinha de nascer um casamento com ele. Não
tardou que as pretensões de Andrade se inclinassem puramente à outra.
“Tanto melhor” pensou Carlota, logo que o percebeu.
A idéia de Carlota é que, sendo assim, não ficava ela obrigada a desposá-lo; mas esta
idéia não a formulou inteiramente; era confessar que estaria inclinada a casar.
Passaram-se ainda algumas semanas, oito ou dez, até que um dia anunciaram os
jornais a chegada de Romualdo. Ela mandou-lhe um cartão de cumprimento, e ele deu-se
pressa em pagar-lhe a visita. Acharam-se mudados; ela pareceu-lhe menos pálida, um
pouco mais tranqüila, para não dizer alegre; ele menos áspero no aspecto, e até mais
gracioso. Carlota convidou-o a jantar com ela daí a dias. A amiga estava presente.
Romualdo foi circunspecto com ambas, e, posto que trivial, conseguia pôr nas palavras
uma nota de interesse. O que, porém, realçava a pessoa dele era — em relação a uma, a
transmissão do recado do marido, e a respeito da outra a paixão que sentira pela
primeira, e a possibilidade de vir a desposá-la. A verdade é que ele passou uma noite
excelente, e saiu de lá encantado. A segunda convidou-o também para jantar daí a dias, e
os três reuniram-se outra vez.
— Ele ainda gosta de ti? perguntava uma.
— Não, acabou.
— Não acabou.
— Por que não? Há tanto tempo.
— Que importa o tempo?
E teimava que o tempo era cousa importante, mas também não valia nada,
principalmente em certos casos. Romualdo parecia pertencer à família dos apaixonados
sérios. Enquanto dizia isso, olhava para ela a ver se lhe descobria alguma cousa; mas era
difícil ou impossível. Carlota levantava os ombros.
Andrade supôs também alguma cousa, por insinuação da outra viúva, e tratou de ver
se descobria a verdade; não descobriu cousa nenhuma. O amor de Andrade ia
crescendo. Não tardou que o ciúme viesse fazer-lhe cortejo. Pareceu-lhe que a amada via
o Romualdo com olhos singulares; e a verdade é que estava muita vez com ele.
Para quem se lembra das primeiras impressões das duas viúvas, há de ser difícil ver na
observação do nosso Andrade; mas eu sou historiador fiel, e a verdade antes de tudo. A
verdade é que ambas as viúvas começavam a cercá-lo de especiais atenções.
Romualdo não o percebeu logo, porque era modesto, apesar de audaz, às vezes; e da
parte de Carlota não chegou mesmo a perceber nada; a outra, porém, houve-se de
maneira que não tardou em descobrir-se. Era certo que o cortejava.
Daqui nasceram os primeiros elementos de um drama. Romualdo não acudiu ao
chamado da bela dama, e esse procedimento não fez mais do que irritá-la e dar-lhe o
gosto de teimar e vencer. Andrade, ao ver-se posto de lado, ou quase, determinou lutar
também e destruir o rival nascente, que podia ser em breve triunfante. Já isso bastava;
mas eis que Carlota, curiosa da alma do Romualdo, sentiu que este objeto de estudo
podia escapar-se-lhe, desde que a outra o quisesse para si. Já então eram passados
treze meses da morte do marido, o luto estava aliviado, e a beleza dela, com ou sem luto,
fechado ou aliviado, estava no cume.
A luta que então começou teve diferentes fases, e durou cerca de cinco meses mais.
Carlota, no meio dela, sentiu que alguma cousa batia no coração de Romualdo. As duas
viúvas em breve descobriram as baterias; Romualdo solicitado por ambas, não se
demorou na escolha; mas o desejo do morto? No fim de cinco meses as duas viúvas
estavam brigadas, para sempre; e no fim de mais três (custa-me dizê-lo, mas é verdade),
no fim de mais três meses, Romualdo e Carlota iam meditar juntos e unidos sobre a
desvantagem de morrer primeiro.
Corpora
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